domingo, fevereiro 24, 2013

Pune - Diário de Bordo - Dia 3


Na véspera de voltar aos escritórios do "tech center" resolvi dar mais umas voltas pela cidade. Finalmente recuperei do jet lag e acordei a horas normais, o que me permitiu tomar um belo pequeno almoço à beira da piscina antes de me aventurar em mais um passeio de tuctuc. Pedi ao motorista para me levar até ao edifício da missão de Sadhu Vaswani, onde existe uma exposição sobre a vida do guru que dá o nome ao local. A missão em questão ajuda centenas de milhares de pessoas todos os anos, desde participando em equipas de apoio a populações em situação de calamidade, até às escolas onde educam milhares de crianças segundo os princípios do movimento Mira. Sadhu Vaswani foi um homem virtuoso, considerado hoje uma espécie de santo. A exposição mostra momentos chave da sua vida em vários formatos, desde esculturas em cera, passando por pinturas, filmes, animações e projecções holográficas. Da visita guiada de 90 minutos fica no ouvido a frase "to be happy, make others happy". Uma coisa que me intriga quando tento saber mais pormenores sobre a cultura daqui, é a que tipo de religião estãos os eventos, locais ou personagens associados. Neste caso foi fácil perceber, já que numa parte da exposição, em resposta a esta mesma pergunta o guru responde: "my religion is humanity". Entendido.

Depois da voltinha da manhã, voltei ao hotel pois tinham-me indicado que haveria um almoço especial. Lá fui eu, mentalizado para subir mais um degrau na escala do picante. Ainda assim na hora H armei-me em maricas, e pedi ao Abhishek (o funcionário que me tem dado as dicas mais úteis sobre os locais a visitar) que me trouxesse o tandoori chicken sem ser muito picante. Ou seja, comi o tandoori chicken mais picante da minha vida. Chegou-me a escorrer uma lágrima no canto do olho na primeira garfada que dei à confiança, mas que ocultei discretamente com os óculos escuros que felizmente levei comigo. Passado um bocado de ter desentupido os canais lacrimejais e o nariz, aquilo até começou a saber bem e consegui terminar a refeição com sucesso.

Após ter sobrevivido a tal refeição, agarrei em meia dúzia de comprimidos Imodium Rapid, guardei-os no bolso e fiz-me novamente à estrada. Apanhei o motorista de tuctuc mais chato e divertido em simultâneo, que tive até ao momento. Este não falava uma única palavra de inglês, mas conversava pelos cotovelos e ria-se muito. O próprio valor da viagem foi difícil de acordar. Da boca dele saía algo parecido com "tufi", que admiti querer dizer "two fifty" que é como quem diz 250 rupias. Achei que para me levar ao local pretendido era razoável e lá fomos nós. Durante todo o caminho o homem apontava para sítios, dizia coisas e ria-se muito. Eu sorria de volta já que me restava pouco mais a fazer. A determinada altura passámos num local onde havia uma festa com uma banda a tocar música muito alto, e o homem gritou histérico as primeiras palavras que percebi: "India dance party!!!". Quando cheguei ao destino, entre gestos e palavras imperceptíveis, entendi que o homem queria esperar por mim para fazer a viagem de regresso. Acenei que sim com a cabeça e o homem não quis aceitar o dinheiro da primeira metade da viagem. Ou seja, se eu me pisgasse, o homem tinha perdido as 250 rupias.

Quando cheguei à entrada do local que queria visitar, percebi porque se chama "Pavarti Hill". Em plena cidade de Pune existe uma encosta tão inclinada que, em combinação com o calor que se fazia sentir, levei uns 10 minutos a subir. Chegado finalmente ao topo da colina, passando por vendedores ambulantes, pedintes e gado, encontram-se vários templos e um museu com várias referências Peshwa. Existem muitas referências ao império Maratha, em quase todos os locais. Calcei-me e descalcei-me umas 3 ou 4 vezes para poder entrar em cada um dos templos ali reunidos. O nível de confiança em deixar os ténis no meio da rua não melhorou muito, já que existia uma tenda a vender calçado junto ao local! Pelo menos não voltava descalço para casa... Terminada a visita aos templos e museu, chegou a hora de descer a encosta. Aqui fui rodeado por um grupo de miúdos a pedir esmola, que eu dei, e que serviu para gerar em todos eles um sorriso de orelha a orelha seguido de muitos agradecimentos. Na base da colina esperava o meu motorista.

Na viagem de regresso, percebi que me queria dizer qualquer coisa mas como a comunicação era impossível fui acenando e sorrindo. Quando parou junto a um mercado enorme, percebi que queria que eu fosse às compras. Rapidamente chamou alguém que veio ter comigo, e me tentou vender um gramofone antigo todo dourado. Não me perguntem o porquê da sugestão. Sorri e declinei respeitosamente. Sorriram os dois de volta, o amigo do motorista afastou-se e continuamos viagem. Na primeira tentativa levou-me até ao Meridien, um hotel muito bonito, mas pouco interessante para mim que estou no Marriott. Lembrei-me que inicialmente tinha apanhado o tuctuc já longe do hotel. Lá consegui fazê-lo entender em que hotel estava, e continuámos até ao destino. No final pediu-me mais 100 rupias pelo facto de ter estado à minha espera. Disse-lhe que não. Insistiu sorrindo, fazendo sinal de quem emborca uma garrafa e dizendo a segunda coisa que entendi vinda da sua boca: "Beer!". Deixei-me rir com ele, convenci-o a tirar-me uma foto a conduzir o seu tuctuc e dei-lhe as rupias. Agradeci e despedi-me da personagem.

De volta ao hotel, e já no conforto do meu quarto, percebi que tinha as entranhas a carburar de forma diferente, ainda que estando tudo controlado. Disse assim a mim próprio que a próxima refeição deveria ser o mais sensaborão possível, para ver se não causava danos irreversíveis. Assim, fui jantar, expliquei a minha preocupação e deixei-me convencer a provar um prato típico de nome impronunciável, mas que de acordo com o empregado não tinha nenhum picante. Explicou-me tratar-se de galinha com uma espécie de molho de manteiga, que se come com popper, umas fatias de pão fino, do qual me deu dois tipos diferentes para provar. O prato tinha uma excelente apresentação e era óptimo... mas picante como tudo. E eu comi na mesma. Caros amigos, se no espaço de dois ou três dias não tiverem notícias minhas, liguem para o Marriott e peçam para procurarem por mim no WC do meu quarto.

4 comentários:

ACCM disse...

Devias ter levado também KOMPENSAN...
Então a foto de ti a conduzires os TUCTUC?

mcaa disse...

Mas que aventuras.
Tem cuidado. Beijinho grande
Mãe.

Susy disse...

Amigo, uma coisa é certa vais perder uns quilitos e teres recordações para contares aos teus netos :)
Continuação de boa viagem.

Marco disse...

accm: já coloquei no post seguinte...

mcaa: beijinhos!

susy: os quilos podem ir, desde que não levem nada atrás... obrigado!