segunda-feira, julho 20, 2020

Passeio Geométrico - Dia 4/4

O quarto e último dia de viagem seria o que nos iria levar de volta a casa, a partir de Vila Real de Santo António. A ideia era manter o princípio de evitar autoestradas, pelo que o caminho seria feito maioritariamente por estradas nacionais e algumas municipais. O plano inicial era fazer a travessia de ferry já próximo do final, em Setúbal, mas acabaríamos por abandonar essa ideia, aproveitando assim para fazer mais uns quilómetros e incluir uma passagem pela Arrábida em tom de despedida.

Após um sono recuperador no extraordinário alojamento onde pernoitámos, acordámos para descobrir que tínhamos o nosso equipamento infestado de formigas que durante a noite resolveram fazer uma invasão silenciosa. O pequeno almoço que tomámos na padaria que tínhamos mesmo à porta, com uma bela padeirinha (dona de um belo padeiro) a servir, serviu para nos livrarmos de boa parte das formigas que ocuparam o forro dos nossos capacetes, sendo que só a meio da manhã nos livrariamos totalmente da bicharada. Portanto, Vila Real, eu te batizo "terra de melgas e de formigas".

Depois de uns desinteressantes quilómetros na N125 em passo de caracol, e uma breve paragem em São Brás de Alportel, finalmente chegámos ao único troço de jeito da nossa manhã: cerca de 60 quilómetros na N2 em plena Serra do Caldeirão. Paragem no quilómetro da besta (666) para o registo fotográfico que se impunha. E o calor continuava a fazer-se sentir (e bem).

Percorrida a Serra do Caldeirão a bom ritmo, o Pedro fez questão de me tentar iniciar na prática do registo fotográfico das abrasadelas na borracha dos pneus, mas sem grande sucesso. O pneu da F estava assim.

A paragem para hidratação (já mais que necessária) em Almodôvar, onde um companheiro de duas rodas com não menos que uns 80 anos de idade aparcou junto a nós, enquanto mandávamos abaixo umas minis mais que merecidas. Respeito pelo senhor!

Tempo de seguir viagem. O plano era pararmos antes de chegar à costa vicentina, para almoço. Apontámos o Cercal como o nosso objetivo, e lá fomos andando. As lindas retas do Alentejo são propícias a esquecermo-nos dos limites de velocidade, fato do qual nos lembrámos quando passámos "ligeiros" por um GNR na beira da estrada, que olhou para nós com um soslaio tipicamente alentejano e não pensou nisso uma segunda vez.

Chegados ao Cercal, o calor raiava o limite do suportável. Soube-me pela vida um aspersor mal direcionado numa rotunda, que me deu uma leve banhoca ao passar por ele. Passámos pelo centro da povoação mas voltámos atrás e estacionámos próximo da primeira esplanada que nos pareceu minimamente decente para comer (e beber) qualquer coisa. Ainda antes de escolher, vieram as minis.

A refeição foi ligeira. Uma tosta para cada um (exceto para o escanzelado do Pedro, que no final pediu mais uma "bifaninha" - estou em crer que o homem tem ténia...). A mim pessoalmente, o calor dá sede mas tira o apetite. No final, foi a minha vez de dar uma de macho e pedir um geladinho, de acordo com as regras impostas pela DGS (mais ou menos).

Quando está demasiado calor, vale mais andar de mota do que estar parado, pelo que retomámos a nossa viagem, sendo que a expectativa era que a proximidade do mar nos fosse dando umas tréguas em termos de temperatura. Seguimos em direção a Sines, para depois seguir caminho até à Comporta, com uma paragem para abastecimento em Melides pelo meio.

A Comporta estava igual a si mesma. Alguma gente de férias, uma atmosfera antiga, datada, mas sempre acolhedora e a oportunidade de mais hidratação.

No largo principal, além das esplanadas que servem de abrigo ao calor, as cegonhas marcam também a sua presença com ninhos em tudo quanto é lado. A torre da igreja não é exceção. Uma última discussão sobre o caminho a percorrer, e o abandono definitivo da ideia de fazer a travessia por ferry em Setúbal. O risco de não estar a funcionar o ferry, ou de nos demorarmos mais do que gostaríamos na espera, fez-nos optar por virar em direção à Carrasqueira e seguir até Alcácer do Sal.

Já no aborrecido IC a caminho de Setúbal, sobrevivemos por pouco a um camião que fez uma ultrapassagem no sentido oposto, que mais parecia uma pega de caras. Saímos ambos da estrada para deixar o senhor passar, claramente iria em marcha de urgência para entregar batatas em alguma superfície comercial, ou algo do género. O trânsito deprimente que se começava a fazer sentir, denunciava que estavamos próximos do final da nossa viagem.

Após chegarmos ao centro de Setúbal, tentei uma visita ao Forte de S. Filipe, que estava fechado. Saltámos esse passo e atacámos as curvas da Arrábida, que seriam a última cereja no topo do bolo da nossa viagem.

A vista para o mar foi a chave de ouro para a nossa viagem. Uma breve paragem depois de percorrida a Arrábida para a despedida, e os últimos quilómetros juntos até cada um seguir o seu caminho.

Esta viagem de quatro dias, ainda que com calor extremo e mau tempo à mistura, foi mais um presente que demos a nós próprios. Muita estrada boa percorrida, em boa companhia e excelente disposição. Um bálsamo, sobretudo para mim que durante este ano poucos quilómetros de mota tive oportunidade de fazer. Sempre que acabo uma viagem destas, penso que facilmente me habituaria a esta vida... enquanto não posso fazer disto a minha vida, vou saboreando estes momentos, com alguns amigos que não se importam de partilhar a estrada comigo e contribuir para estas experiências e aventuras.

Cerca de 1600 quilómetros depois, estavamos em casa... Venha a próxima!

domingo, julho 19, 2020

Passeio Geométrico - Dia 3/4

O terceiro dia do passeio geométrico era o mais desafiante em termos de distância a percorrer. O plano geral era ir de Penamacor até Vila Real de Santo António, percorrendo uma distância ligeiramente superior a 450 kms. Sabíamos no entanto que parte significativa deste percurso, sobretudo a partir da zona do Marvão, seria relativamente desinteressante, até porque a entrada no Algarve não seria feita pelo Caldeirão. Adicionalmente, seria o dia em que o João regressaria a casa, não ficando connosco para o regresso no dia seguinte.

Posto isto, e depois de um bom pequeno almoço (ainda) em família, albardaram-se as burras e preparámo-nos para seguir viagem. Faríamos apenas uma paragem para abastecer e tomar café ainda antes de chegar a Castelo Branco, durante a qual nos apercebemos que o dia seria "agreste" relativamente à temperatura que logo de manhã se fazia sentir...

A primeira tirada da manhã foi um misto de troços menos interessantes com algumas curvas divertidas, sobretudo na N18 já depois de Castelo Branco. Fez-se de forma rápida, e lá fomos andando até à primeira paragem da manhã, no Marvão.

No Marvão, e com um olho a espreitar Espanha já ali, foi tempo de hidratação. Talvez pela proximidade do país de nuestros hermanos, era visível a quantidade de Espanhóis com que nos cruzávamos em todo o lado. Claramente não era o COVID que os ía impedir de fazer turismo em terras lusas...

Ainda era cedo para almoçar, e os princípios nutritivo-religiosos do João "empurravam-nos" para um almoço que se antecipava tardio, por isso resolvemos fazer mais uma tirada maior antes de parar para almoçar. Cortesia da COVID, e sabendo nós da existência de uma espécie de cerca sanitária em Monsaraz, onde o nosso plano inicial nos levava, resolvemos adaptar-nos e fazer um desvio alargando o percurso até Évora. A partir daí logo se via o que faríamos. Antes disso, e só naquela de respirar por uns instantes, parámos numa escassa sombra nos arredores do Crato, só para recuperar.

Finalmente chegámos a Évora. Naveguei-nos a todos diretamente para um local que já conhecia junto à Capela dos Ossos, onde antecipei poderíamos comer decentemente e sem nos embrenharmos em grandes confusões no centro da cidade. Dado o calor que se fazia sentir, levava em mente algo leve como uma salada e beber qualquer coisa fresca, mas o escanzelado do Pedro começou a lançar um olhar guloso para uma sopa de cação na mesa ao lado, e acabei por me sentir na obrigação de lhe fazer companhia... a saladinha ficou para o gordo do João.

Depois de um belo repasto no restaurante O Cruz, seria tempo de nos despedirmos do João, que faria o regresso a casa a partir dali, enquanto eu e o Pedro seguiriamos em direção a sul. Despedidas feitas, e saímos de Évora em direção a Moura, com o objetivo de uma paragem intermédia junto ao Alqueva.

Assim fizemos. Ficámos surpreendidos porque contávamos com uma temperatura mais amena nos arredores da barragem, mas não foi o caso. O calor claramente não iria dar qualquer espécie de tréguas naquele dia, e o melhor era habituarmo-nos a essa ideia.

Tornava-se novamente imperativo parar novamente para hidratar, pelo que fizemos a paragem seguinte em Moura, onde simplesmente parecia termos aterrado numa terra deserta, onde não se avistava vivalma. Valeu-nos um tasco aberto, enfiado num recanto da zona histórica, onde uma senhora com cara de poucos amigos nos vendeu umas minis, que bebemos sentados à sombra de uma árvore ali mesmo ao pé das muralhas do castelo

Uma vez hidratados, seguimos novamente viagem. O plano agora era fazer a próxima paragem próximo das minas de S. Domingos, onde existe a praia fluvial da Tapada Grande. Certamente saberia bem fazer a hidratação seguinte com direito a vista.

A praia fluvial efetivamente estava convidativa, mas a quantidade de pessoas junto ao bar de apoio fazia-nos pensar logo num viveiro de COVID, pelo que decidimos hidratar noutro lado qualquer menos populado. E eu já conhecia um quiosquezinho junto à estrada que serviu perfeitamente para o efeito.

O destino estava próximo, e a ideia era ainda antes de passarmos por Mértola, fazer o último abastecimento do dia e só parar só no destino final. Fizemos tudo isso, menos a parte de abastecer, que nos esquecemos. Já relativamente próximo de Vila Real o Pedro começou a temer pelo pior, quando a Tracer deixou de assinalar autonomia após umas dezenas de quilómetros já na reserva... Abrandámos o ritmo e começamos as rezas para não "morrermos na praia". E assim foi, devagarinho lá chegámos ao fresco da ria, para logo depois entrar em Vila Real e encostar nas primeiras bombas que apareceram. Tínhamos feito pouco mais de 300 kms com um depósito.

Encontrada com facilidade a residência Matos Pereira, um alojamento sem jeito nenhum e que não recomendo a ninguém, mas que foi o possível de arranjar dentro dos timings apertados em que planeei esta viagem... tomada a banhoca e recuperadas as energias, lá fomos à procura de um lugar para jantar.

Armados em finos, escolhemos um spot à maneira na marginal com vista para o rio, escolhemos um peixinho da bancada mandámos vir o branco à pressão. O Pedro estava armado em maricas com medo que as melgas atacassem, coisa que lhe afiancei com toda a confiança não iria acontecer, porque de paragens anteriores por ali nunca tal tinha sucedido. 5 minutos depois estavamos literamente a ser devorados por bicharada que apareceu vinda sabe-se lá de onde. 

A bicharada eventualmente lá desapareceu, e com umas camadas de repelente e de uma banha da cobra vinda da Tailândia, que o Pedro iria deixar esquecida no restaurante, conseguimos apreciar um belo jantar. Antes de regressarmos ao alojamento, o Pedro armou-se em macho e parámos num spot junto ao largo da câmara municipal, para comer um "picolé". Só para que fique registado, eu bebi um mojito.

Era tempo de ir descansar. Demos as boas noites às burras que ficaram à porta do nosso estaminé, e entrámos, não sem antes lavar as mãos com uma mistela que devia ser alcóol-gel, mas pelo cheiro seria mais bagaço-gel. Afinal, queríamos manter aquele estabelecimento de nível livre de COVID!

 No dia seguinte, haveria mais.

sábado, julho 18, 2020

Passeio Geométrico - Dia 2/4

O segundo dia, aquele que mais prometia, começava. O trajeto definido era o que mais (e melhores) curvas apresentava, e a paisagem era também a mais interessante.


Como o nosso alojamento não incluía pequeno almoço, rapidamente nos preparámos e fomos até à garagem desfazer o "tetris" de motas que tínhamos montado na noite anterior, para regressar à estrada.


Pouco depois de arrancar procurámos um estábulo que permitisse dar de beber a burras e comer a burros em simultâneo. Logo após passar a ponte D. Luís e percorrendo poucos metros pela marginal, encontrámos o lugar certo.


Houve quem desse uma de macho e mostrasse como é que se começa o dia à moda do Porto: com um belo copinho de leite magro...


Baterias recarregadas, rapidamente percorremos os quilómetros que se seguiam na N108, com o objetivo de chegar à N222, a célebre estrada que permite percorrer o Douro de uma ponta à outra do país.


A N108 estava um bocadinho carregada de ciclistas e o traçado não favorece situações livres de risco, pelo que apesar da beleza da envolvente, eu pessoalmente tinha mais expectativas relativamente à N222 (que já conhecia de passeios anteriores).


Percorrida a primeira tirada de quilómetros na N222, passando primeiro sobre o rio Paiva, chegámos a Pias, onde parámos num parque junto a um açude com muito bom aspeto, junto ao rio Bestança.


O calor já se fazia sentir, e bem, mas ali em particular estava uma ventania tal que até levantou um chapéu de sol pelos ares!


E apesar de andarmos a passear, como motards bonitos, asseados e bonzinhos que somos, cumprimos sempre com as regras impostas pela ditadura da COVID-19!


Desta vez houve quem abdicasse dos copos de leite, e optasse por algo à base de cereais, nomeadamente cevada, no que diz respeito à hidratação. Não deixa de ser uma opção saudável. Repostos os níveis de hidratação, lá fomos nós outra vez.

A paisagem e a vista do douro enquanto percorremos a N222 é sempre sublime. Sem dúvida uma das melhores estradas para fazer mototurismo do país. Fácil perceber porquê.


O destino do final da manhã era o Pinhão, onde pretendíamos almoçar. O calor já era abrasador e nem a proximidade do rio, aliviava a coisa. Tivemos de reposicionar as burras na tentativa de lhes arranjar alguma sombra, o que deu origem a mais um momento Tom Cruise da viagem...


Estacionadas as burras na sombra possível, sentámo-nos numa esplanada que mais parecia uma estufa, tal era o calor que se fazia sentir. A sede era tanta que achámos por bem ser "higiénicos" na escolha do que iríamos comer e beber, caso contrário ficaríamos ali a hibernar o resto da tarde. Uma saladinha e coca-cola zero para todos! Não é algo de que me orgulhe muito, mas aqui fica o registo fotográfico desta situação pouco comum e inusitada...


Como nos sentíamos melhor em andamento do que parados, terminada a refeição fizemo-nos de novo à estrada. Apesar de no nosso roadbook a ideia ser começar já a descer em direção a sul, a N222 estava a saber-nos bem, e numa inversão o Pedro convenceu-me facilmente a percorrer mais uns quilómetros seguindo a placa em direção a S. João da Pesqueira.


As encostas do Douro são realmente uma paisagem que me impressiona sempre, e é sempre com prazer que as percorro de mota. Sem diminuir o mérito da paisagem, os quilómetros seguintes também foram recheados de curvas das boas, e o dia continuava a saber-nos a todos muito bem.

Como volta que é volta não se faz sem nos enganarmos pelo menos uma vez no caminho, eu na qualidade de navegador fiz-nos desviar uma dúzia de quilómetros da rota. Quando começámos a percorrer retas que mais pareciam tiradas da paisagem alentejana, percebi que estávamos mal e demos meia volta para voltar ao nosso caminho.


Mais uma barrigada de quilómetros e pouco antes de chegarmos ao parque natural da Serra da Estrela, parámos num tasco à beira da estrada para mais um momento de hidratação.



Nesta altura eu e o João aproveitámos para continuar a achincalhar a ave agoirenta do Pedro, que tinha passado o dia inteiro a dizer que éramos capazes de apanhar mau tempo, e até então a única coisa que tínhamos apanhado era sol e um calor abrasador. O achincalho passou por sacar de material impermeável...


Como não nos ocorriam mais formas de gozar com o Pedro, lá nos fizemos novamente à estrada, porque estávamos com vontade de percorrer a N18 que contorna parte do parque natural da Serra da Estrela pelo lado Este. Esse troço sem dúvida que viria a corresponder às nossas expectativas.

A paragem seguinte seria já em Belmonte, a poucos quilómetros do nosso destino final daquele dia. Mais uma paragem para hidratação, depois de outra bela barrigada de curvas.



Estava eu a degustar a minha cerveja artesanal à base de cereja, da região, eis senão quando... nuvens... pingos de chuva... trovoada... sacana de ave agoirenta... quem se ri agora?


Escusado será dizer que, apesar de tentarmos sair dali à pressa, apanhámos um temporal de chuva e vento que nunca imaginaríamos ser possível tendo em conta o dia que tínhamos passado, e tudo com o nosso equipamento de verão, em nada impermeável. Até troncos que caíram para a estrada tivemos de andar a desviar!


Quando achámos que a coisa estava a ficar mais perigosa do que devia, procurámos abrigo numas bombas, estacionámos as burras no telheiro da lavagem automática e fomos até ao café beber uns copos enquanto o pior do temporal não passava.


O temporal nunca chegou a passar, mas abrandou o suficiente para ganharmos coragem para os 40 quilómetros que faltavam. Lá vestimos o equipamento encharcado para o encharcar um pouco mais, e fomos seguindo viagem penosamente até ao destino final. Ao chegar a Penamacor já conseguia vislumbrar aquele oásis que a casa dos meus sogros iria proporcionar a estes três gatos pingados (literalmente). E assim foi, a melhor forma de terminar o dia, com direito a um banhinho quente e um jantar em família.

No dia seguinte haveria mais.

sexta-feira, julho 17, 2020

Passeio Geométrico - Dia 1/4

Habitualmente e de há uns anos para cá, reservo sempre uns dias para fazer uma viagem "internacional" de mota, em que rodo muitas vezes mais quilómetros pelo país de nuestors hermanos do que em terras lusas. Este ano, cortesia da COVID-19, esses dias foram passados de forma mais caseira como férias tradicionais em família. O espírito é que não se sossegou com a falta de quilómetros percorridos em duas rodas, e acabei por ir buscar um projeto à gaveta que foi logo assinado em baixo por dois amigos que padeciam da mesma ressaca de andar de mota que eu.

Intitulei esta rota de "passeio geométrico", porque a ideia era percorrer o país num formato mais ou menos retangular. Ainda assim, quando se começaram a afinar os pormenores, o desenho retangular foi-se esbatendo e acabámos por selecionar partes da rota que considerávamos mais interessantes e outras que evitavam que o caminho percorrido fosse tão cansativo ou aborrecido. Ainda assim ficámos com uns 1600 kms para percorrer em 4 dias (sem recurso a autoestradas).

Juntaram-se assim três estarolas com as suas respetivas burras: a minha fiel BMW F800R (a melhor), uma Yamaha Tracer 900 e uma Aprillia Shiver 900, todas elas prontas (mais do que nós) a apanhar uma caloraça nos dias que se iriam seguir (quase sempre...). O primeiro dia seria feito junto à costa da zona centro e norte, com destino a Vila Nova de Gaia, o primeiro local de pernoita.


O ponto de encontro definido foi o mercado municipal de Torres Vedras, onde se comem umas bifanas saborodas, mas bem salgadas, a puxar a imperial que as acompanha: a base de qualquer pequeno almoço nutritivo. Já eu tinha deglutido a minha quando apareceu o Pedro que logo a mim se juntou.


Havia quilómetros a percorrer e vontade de rolar, pelo que não nos detivemos muito por ali e seguimos para o percurso de aquecimento que nunca desaponta: as curvas até ao Bombarral. Os pneus começavam a agradecer e ansiávamos pelo afastamente daquela parte da zona oeste na esperança de ver sol. Chegados ao Bombarral fizemos uma paragem rápida para abastecer e seguimos em direção a São Martinho do Porto, onde faríamos nova paragem.


Em São Martinho do Porto, o tempo continuava tinhoso e o sol meio escondido. Não que isso impedisse a malta de estar ali na praia. Parámos a espreitar o mar por um bocado enquanto comíamos mais qualquer coisa numa esplanada. A parte seguinte da viagem seria feita pela estrada atlântica, que apesar do traçado menos interessante proporciona sempre uma paisagem envolvente muito porreira.

Passámos ao lado de Leiria, pela zona florestal que revela ainda as cicatrizes dos últimos incêndios e seguimos em frente até à paragem seguinte, na famosa praia do Cabedelo. Neste último troço finalmente o sol deu um ar da sua graça, com a promessa de calor. Parámos, vimos novamente o mar e procurámos um spot porreiro para almoçar.



Ali começámos a picar o nosso terceiro companheiro que só se juntaria a nós ao final do dia, em Vila Nova de Gaia. Roído que estava por ainda estar a trabalhar aquela hora, era fácil espicaçá-lo. O almoço foi leve, à base de umas tostas e baguetes. Fome saciada, lá seguimos outra vez.



Mais uns quilómetros de estrada percorridos junto ao mar, e o próximo destino seria a última praia visitada do dia: praia da Vagueira. O calor aqui já se fazia sentir e bem, apesar de o vento e o mar batido daquela praia ajudarem a refrescar um pouco. Mais hidratação, e confirmámos que o nosso terceiro elemento do grupo já estava de saída para uma viagem em modo pápa-léguas até Vila Nova de Gaia por AE, onde nos encontraríamos.

O último troço da nossa viagem foi do mais aborrecido que possa haver. Estrada nacional com semáforos, trânsito de semana e pesados aos pontapés. Lá fomos percorrendo estes últimos quilómetros de forma penosa, até finalmente entrarmos em Gaia. Dirigi-me à Av. da República e parei para procurar no mapa o nosso hotel. Olho para o meu lado direito e estava em frente a ele. Pontaria. Fizemos checkin.



Feito o checkin e enquanto esperávamos pelo João, era tempo de mandar finalmente umas canecas abaixo. Procurámos um spot porreiro com vista para o rio e para as motas (fator sempre importante a ter em consideração) e vieram as primeiras canecas e os primeiros tremoços. Passado um pouco o João tentava desesperadamente juntar-se a nós, mas as sinuosas ruelas de sentido único e/ou proibído da zona ribeirinha de Gaia não ajudavam, assim como o GPS. Fui à procura dele e lá o avistei ao longe. Disse-lhe adeus e juntou-se a nós para mais umas canecas antes de jantar.


O restaurante escolhido não era longe, mas como queríamos ter as nossas meninas debaixo de olho, fizemos o nosso momento Tom Cruise e desviámos as burras uns metros para o lado. Ficaram quase a fazer-nos companhia na esplanada onde jantámos. Ninguém comeu o que queria (eu e o Pedro tinhamos na mente francesinha, o João tinha na mente filetes). Mas os bifes de frango e o salmão que afinal veio dourada, não estavam maus. As garrafas de Muralhas ajudaram a compensar, e o jantar durou até pouco depois das 23h.

Fez-se o regresso ao hotel, parquearam-se as burras na garagem e os burros no quarto. O primeiro dia tinha sido bom, mas o dia seguinte, prometia.