sábado, março 02, 2013

Pune - Diário de Bordo - Dia 8


E foi hoje que tirei a barriguinha de misérias a nível de conversa! Em vez do silencioso Mr. Soshant, apareceu-me hoje um tipo chamado Gaikwad que foi o caminho inteiro a conversar comigo. Era uma figura caricata! Muito magro e sem nenhum dente da frente na parte inferior da "cremalheira". Mas fazia-se entender perfeitamente (o outro tem os dentes todos e não fala mais por isso). Conversámos o caminho todo sobre um pouco de tudo, começando pelo transito, carros, motas (é um apaixonado), passando pela política até à religião. A determinada altura perguntou-me se era católico. Depois contou-me que apesar de ser budista amava Jesus Cristo, e explicou-me porquê. Numa altura mais complicada da vida dele estava prestes a deixar o seu emprego. Isto porque fazia um percurso casa/trabalho de cerca de 80 kms, que demorava 2 horas a fazer, isto é, passava por dia umas 4 a 5 horas na estrada, e não conseguia continuar a fazer isso. Um dia uma amiga levou-o a uma igreja, convenceu-o a rezarem juntos e bebeu água benta. No dia seguinte quando ia apresentar a sua demissão, o patrão não só a recusou, como o colocou a trabalhar perto de casa. Assim se processa a fé por aqui. Tem uma imagem de fundo no telemóvel com Jesus Cristo e a Nossa Senhora, que fez questão de me mostrar.

O trabalho correu bem. Aqui não se tem nenhum minuto de descanso, e o almoço é coisa para não durar mais do que uns 15 minutos. A malta quando desce para almoçar, se vê que a coisa está complicada (o que é fácil de perceber numa zona de restauração que serve 100 mil pessoas), volta para o seu posto de trabalho e depois come qualquer coisa durante a tarde. Comi outra vez o Veg Thali com as mãozinhas, e soube melhor do que ontem. Conversei um bom bocado com o meu colega vegetariano, que está a trabalhar em permanência em Singapura (também estava por aqui de visita) e segundo percebi seguia hoje para Manchester (vivemos/trabalhamos realmente numa aldeia global). Sinto que estou a conseguir ajudar a progredir algumas tarefas. Tenho no entanto de me forçar a manter à parte de outras tantas que sei que na melhor das hipóteses estarão à minha espera quando voltar. O pessoal aqui é cinco estrelas, e fazem com que sinta que sou parte da equipa. Além disso era para mim importante conhecê-los. No futuro será uma vantagem, se continuar a trabalhar com eles.

O final do dia chegou, e penso que a possibilidade de ir trabalhar durante o fim de semana está para já afastada. Ainda existe essa hipótese, mas hoje aproveitei o facto de o meu chefe estar de folga para deixar a ideia cair no esquecimento. No entanto se os meus colegas me ligarem a dizer que precisam de mim, decidi que não vou dizer que não e lá irei ter com eles, com muito gosto. No meu regresso para casa tive mais uma boa dose de conversa com o Gaikwad, que me pediu desculpa pelo facto de lhe sair a língua de vez em quando pelo intervalo dos dentes que tem em falta. Contou-me mais um bocado da sua vida, explicou-me algumas banalidades, como a cerveja Kingfisher que lhe contei ter provado, ser a mesma marca que dá nome a uma companhia aérea, cujo proprietário ganhou muito dinheiro mas que o filho se encarregou de estoirar em gajas e festas. Recomendou-me uns locais para ir fazer compras e para visitar durante o fim de semana. Despediu-se de mim com um enorme sorriso desdentado, enquanto me afastava para entrar no hotel. No hotel os sorrisos são menos desdentados mas igualmente rasgados. Fui ao meu treino diário e a seguir jantei junto à piscina, onde as melgas se encarregaram de me fazer despachar a refeição o mais rapidamente possível (grande ideia que eu tive). Engoli o meu "single expresso" e fui descansar.

Nota do autor: faz hoje uma semana que estou aqui. Não tenho tido muito tempo para pensar em muita coisa, mas já tenho bastantes saudades de todos. Um abraço à minha família e aos amigos que me lêem e me incentivam. Um obrigado à Rita, que me emprestou um livro cuja leitura terminei hoje (sim, veio comigo para a Índia) e que foi perfeita para o momento que agora vivo. Um beijo muito especial à Sofia e ao Alex, que me dão todo o apoio que preciso para conseguir sentir-me bem apesar de estar a mais de 7.000 kms de casa.

3 comentários:

ACCM disse...

Um bom dia de descanso para ti filhote, se possível. Diverte-te. Beijinhos
Pai

mcaa disse...

A esta hora já será uma boa noite para ti, meu amor. Beijinho da mãe

Marco disse...

pai/mãe: beijinhos para vocês!