domingo, maio 26, 2019

Astúrias e Picos da Europa - Dia #2

No segundo dia da viagem, acordámos todos de alma renovada. Um novo dia despontara com sol e poucas nuvens como sinal que tudo iria correr pelo melhor. O grupo foi cumpridor, demonstrando que ainda estavam acordados e sóbrios durante o briefing da noite anterior, e apareceram à hora marcada. Abancou tudo no "comedor" do hotel a enfardar ovos, bacon e torradas, de tal maneira que fizeram disparar o quadro elétrico meia dúzia de vezes.



Já de barriga cheia, lá arrumámos os tarecos e fomos gradualmente dando à costa no parque de estacionamento, onde ser realizava a primeira de várias reparações de berma de estrada. A KTM do Ricardo, graças aos alforges e malas que trazia, resolveu começar a descascar a pele tipo cobra... e para evitar mais estragos o Ricardo protegeu as carenagens da forma mais azeiteira possível: com fita cola americana estilo "carbono".



Já com a mota do Ricardo a escorrer azeite por todos os lados, a malta lá se juntou para a foto que se impunha, alinhando lado a lado as 12 burras que fizeram parte do ramalhete que compôs esta edição da viagem.



Como já é tradição em qualquer edição da viagem, existe sempre aquele momento em que nos perdemos. Esta vez não foi exceção, e logo à saída de León, graças à desatualização dos mapas do GPS, andámos a fazer uma espécie de carrossel numas quantas rotundas que o mapa não assinalava. Desisti do GPS e limitei-se a seguir as placas que indicavam o caminho pretendido (uma cena um bocado "old school" mas que ainda funciona). Fizemos o primeiro abastecimento do dia e seguimos viagem.

A primeira parte da viagem foi feita pela N625, uma estrada que está envolta numa beleza natural extraordinária, desvendando já os picos lá ao fundo, e passando por várias povoações pitorescas. Rodámos a um ritmo livre e descontraído, aproveitando aquilo que mais pareciam as lindas retas do Alentejo... Parámos em Puente Almuhey para tomar o cafezinho que já se impunha, antes de desviar para um troço um pouco mais curvilíneo.





Já mais quentinhos por dentro, retomámos viagem e finalmente começámos a apanhar algumas curvas no caminho que nos levaria a um troço de estrada espetacular a acompanhar a margem do Embalse de Compuerto. Uma vez chegados a esta zona, a paisagem natural era simplesmente deslumbrante. Tivemos necessariamente de parar para mais uma fotografia de "equilíbrio dinâmico", que já se impunha.



Uma vez que estávamos junto à água, houve quem temesse o pior pelas "embarcações" que seguiam no grupo. Houve também quem pensasse em eutanasiar a própria burra empurrando-a encosta abaixo até ir para à agua, mas a bem da proteção da natureza, ninguém fez nada.




Entretanto já tínhamos percorrido uma parte significativa do percurso do dia (ainda que os melhores kms estivessem para vir...), pelo que era tempo de ir ver do nosso local de repasto. Seguimos assim rumo a Triollo, enquanto uma chuva molha parvos resolveu aparecer e nos fazia pensar se continuar a rolar sem impermeáveis seria sensato. Foi chuva de pouca dura, e quando chegámos a Triollo, desviámos em direção a Vidrieros já debaixo de sol. Chegados a Vidrieros estacionámos as burras talvez no único local que tinha espaço para o efeito. Dirigi-me a um senhor que nos observava com curiosidade.

- Buenas... hay algún restaurante donde podemos comer? Somos 12...
- Si, aquí mismo. Mi hija os prepara una mesa.


E desapareceu para o interior do restaurante El Molino, enquanto o resto do grupo ainda desmontava e desalbardava parcialmente as burras. O restaurante tinha uma g'anda pinta e ficava num local privilegiado, junto a uma ribeira de água cristalina e mantendo a vista dos picos lá ao fundo.





Já no seu interior, fomos pronta e simpaticamente atendidos e muito bem servidos com o tradicional menú de "primer y segundo" que seria uma constante ao longo de quase todas as refeições. A comida não podia ter melhor aspeto, nem podia saber melhor que o aspeto que tinha...




A "selfish" do dia...



Comemos o "primer"... "segundo"... "postres" e um "café solo" no final, antes de seguir caminho. Já no exterior do restaurante o sol continuava a brilhar, mais um par de fotos, o Carlos pisou uma bosta de vaca para dar sorte, e lá seguimos de novo viagem. A parte da tarde prometia...


Os picos lá ao fundo chamavam por nós, por isso saiu-me o habitual Pessoal, bora lá andar de mota!?, e a resposta foi mais que afirmativa.



Apesar de no geral termos cumprido a velha máxima de "p'ra trás mija a burra, p'ra a frente é que é caminho", para sair de Vidrieros tínhamos sim ou sim de andar meia dúzia de kms até Triollo e retomar a estrada em torno do Embalse de Compuerto. Assim o fizemos. No primeiro cruzamento que apareceu, experimentou-se logo outra velha máxima, a de que "ninguém fica p'ra trás, e se ficar, é um ovo podre!". Neste caso o ovo podre foi o Ricardo, que teve de regressar a Vidrieros em busca de uma balaclava perdida... Voltei para trás em busca das ovelhas tresmalhadas, reuni o rebanho e segui novamente em direção a Triollo.

Já o grupo todo reunido (pensava eu) e finalmente começámos a fazer umas curvinhas com um ritmo mais interessante. Assim fizemos até ao primeiro cruzamento onde aproveitámos para reagrupar e ver o sorriso que já todos traziam nos lábios. Entretanto e enquanto esperávamos, o Pedrosa achou que era altura de fazer mais uma reparação de berma de estrada. Tinha-se partido o suporte da sua top case. Nada que com a ajuda de um fio de cobre do Luís e um par de abraçadeiras minhas, não se resolvesse em questão de minutos.





Entretanto reparámos que a cauda do grupo tardava em aparecer, pelo que antecipei nova dose de ovos podres e lá fui eu em busca do rebanho. Encontrei as ovelhas tresmalhadas e quando falei com o Diogo para perceber o que tinha acontecido, fiquei contente por ter o capacete posto, tal era o risco de levar uma bolachada à Bud Spencer por ter deixado que o grupo se separasse logo à saída de Triollo... :) O Luis na sua calma encerrou a conversa com um "pronto, tá bom assim". Ri-me, demos meia volta e lá nos reagrupámos todos.



Com o grupo junto de novo e com a top case do Pedrosa em segurança, seguimos de novo caminho. Os picos estavam cada vez mais próximos. Já depois de termos passado pelo Embalse de Requejada, curtimos mais uma boa dose de curvas sempre acompanhados de bom tempo, que tendo em conta o que tínhamos passado no dia anterior, era mais que bem vindo!



Continuámos a rumar a norte em direção a Potes, onde fizemos novo abastecimento, que as burras já estavam sequiosas. Uma coisa a ter em consideração neste tipo de região é que as bombas de combustível nem sempre aparecem quando precisamos delas, por isso convém jogar com alguma margem de segurança. A ideia tinha sido abastecer após o almoço, coisa que só foi possível fazer já bem a meio da tarde. Felizmente a margem existia.

Após o abastecimento, e assim que saímos de Potes em direção a Riaño, tivemos "O" momento alto do dia. A primeira dose de curvas que, citando o Pedro, "só por si já tinham feito valer a pena a viagem"! À medida que íamos subindo em altitude, também a estrada e a paisagem pareciam estar cada vez melhor e foi impossível não fazer o percurso em ritmo mais aceso, até ao próximo ponto de paragem: o Mirador del Corzo.







O grupo juntou-se no miradouro em pouco tempo e com um enorme sorriso nos lábios, tal foi o entusiasmo que todos sem exceção sentiram para fazer aquelas curvinhas!



Era agora altura de mais uma fotografia em "equilíbrio dinâmico". O Ricardo fez um novo amigo, um "bife" chamado Eugene que estava ali abancado com a sua caravana, que quando nos viu ficou a pensar nas 5 motas que tinha deixado em casa e que fez questão de se juntar a nós para uma foto de grupo.



A foto que o próprio Eugene nos tirou:



Faltavam poucos kms para o destino final do dia... despedimo-nos do Eugene e... Pessoal, bora lá andar de mota!? Assim foi.

Por esta altura estavamos bem acima dos 1000m, pelo que logo a seguir começámos a descer, mantendo-se a beleza natural envolvente ainda que com estrada menos interessante. Condicionei os kms seguintes a ritmo de passeio, pelo que a poucoa distância de Riaño, chegados à estrada aberta que acompanha o seu Embalse, a Cátia perdeu a paciência e resolveu encetar uma fuga do grupo até praticamente a chegada à vila. Ouvi dizer que, mesmo na cauda do grupo, houve mais quem andasse depressa nessa estrada... ouvi dizer.



Chegados à Vila, parei ao lado da Cátia, ao que ela me perguntou:

- Estás zangado comigo?

Ri muito, pisquei-lhe o olho e segui em direção ao Hostal Restaurante Sainz. Parámos as 12 burras mesmo em frente ao Hostal. Ao longo da viagem, e sempre que olhava para este grupo tão bem composto de burras, sentia orgulho por todos nós, e por estarmos ali.



Feito o checkin, foi tempo de arrumar os tarecos nos quartos, tomar banhoca e ir dar uma espreitadela naquela vila simplesmente magnífica, quer pela natureza envolvente quer pela arquitetura. Ainda antes disso acontecer, o Pedrosa resolveu perder a chave de "su habitación". O Pedro quase se mijava pelas pernas abaixo à espera que o Pedrosa encontrasse a chave. Veio a descobri-la no fundo das calças impermeáveis. Mal sabíamos nós que esta seria a primeira de muitas vezes que o Pedrosa iria perder chaves.














Depois de um dia em que já tinhamos a barriguinha cheia de boas curvas, era agora tempo de a encher também de boa comida. O restaurante escolhido foi mesmo o do hostal, onde a malta se foi reunindo lentamente para mandar abaixo umas cañas.



Nesta noite houve muita conversa, animação, boa comida e muita bebida. Depois do aquecimento feito no restaurante, com cañas, vinho "al tiempo" e umas rodadas de tequilla que o Diogo fez questão que bebessemos no final, era tempo de ir para outras paragens que o dono do restaurante queria fechar o estaminé. Como os shots de tequilla nos arranharam a garganta, resolvemos partilhar o que restava do Moscatel que o Pedro gentilmente tinha levado consigo, entre nós e o dono do estabelecimento, que nos recomendou depois uns bares apenas a uns 40 metros "por la calle", instruções que seguimos.



Seguimos "por la calle" e entrámos no primeiro bar que apareceu, sendo que pouco depois o dono do restaurante apareceu também, acabando por pagar uma rodada a todos os que estávamos presentes (deve ter curtido bué do Moscatel...)!



Não existe relato fotográfico do resto da noite, mas resumidamente, e para os que se aguentaram mais umas horas acordados, incluiu a visita a outro bar, a degustação de whisky de diferentes marcas, um campeonato de matrecos com estratégia 4-3-3 e uma moça que ao início da noite tinha fraca figura mas que mais para o fim nos parecia a todos de uma beleza rara... e mais não digo.

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