quarta-feira, abril 17, 2019

Seca Energética

"Seca" é o termo que tem sido utilizado nos últimos dias para referir a situação que o país atravessa no que diz respeito ao abastecimento (ou falta dele) de combustíveis para a população em geral, e todo o impacto que tal ocorrência tem causado. É também o termo adequado para descrever as transmissões televisivas que têm acompanhado de forma exaustiva a situação, sem no entanto se preocuparem muito com a informação relevante relativa aos motivos da greve dos 800 profissionais responsáveis pelo transporte de matérias perigosas, no país. Ao contrário, tem sido um verdadeiro massacre de imagens de repórteres com bombas de gasolina como pano de fundo, enquanto entrevistam alguns dos muitos condutores que se predispõem a esperar ao longo de filas intermináveis para poderem atestar as suas viaturas.

Não querendo passar para segundo plano a importância da reivindicação, a discussão sobre se é justa ou não, ou os impactos causados pela mesma, este meu texto é muito mais focado naquilo que tenho observado ao longo destes dias, e que diz algo sobre a natureza humana.

O problema da falta de combustível afeta e afetaria sempre todos, mais tarde ou mais cedo. No entanto, assim que surgiram as primeiras notícias sobre a possível escassez de combustível, houve logo uma histeria coletiva que levou multidões a abastecer nas bombas de gasolina mais próximas. Houve até quem fosse munido de jarricans para poder levar ainda uns litros extra para casa, não fosse o diabo tecê-las. E assim tornaram um potencial problema eminente numa situação crítica efetiva em poucas horas. Ninguém pensou que ao abastecer desnecessariamente estaria a impedir que outros, com necessidades mais urgentes, tivessem acesso a esse combustível. Ninguém pensou que fazendo parte de uma afluência desmesurada a postos de abastecimento, se iria criar o caos no trânsito e impedir uma moderada distribuição do combustível até então ainda disponível. E os meios de comunicação regozijaram com esta situação e contribuíram em paralelo para que se fosse agravando e agravando. Hoje começaram a surgir notícias sobre o eventual impacto no fornecimento de outros bens, por exemplo, a supermercados. Tenho a certeza que por esta hora já várias pessoas foram a correr abastecer-se de compras como se um Apocalipse ao melhor estilo dos filmes Mad Max estivesse para chegar.

Fico sempre triste ao ver estas situações, porque ainda que tendo impacto, são claramente algo que não justifica qualquer situação de pânico como aquela que se pretende transmitir. Mas uma vez mais a espécie privilegia o drama e o sentimento de tragédia, ao raciocínio lógico e a calma, e assim age em conformidade. Eu pessoalmente estou feliz por estar longe dos centros urbanos onde tudo isto é ainda mais potenciado ao extremo. Espero que no meu regresso a situação já tenha deixado de ser notícia nos telejornais, para poder encontrar o mínimo de normalidade possível.

Shame on all of us...

2 comentários:

mãe disse...

Foi sem duvida o caos. E tudo graças à comunicação social que adora empolgar tudo o que não presta .
Beijinho
mãe

António Maria disse...

Foi o estouro da manada... e o esfregar as mãos dos vendedores de automóveis eléctricos... (teorias da conspiração à parte).