sábado, agosto 01, 2020

No Country for Old Men

O filme com o título "No Country for Old Men" ("Este País Não é Para Idosos"), pouco ou nada tem a ver com a situação que aqui pretendo comentar, mas o que diz o título surge-me sempre no pensamento quando penso nas situações sociais mais dramáticas resultantes da COVID-19. É de facto aquilo que me preocupa mais, que mais me tira o sono e que mais sentimento de culpa me dá, quando penso nisso. Mais até que o receio de ser infetado. A ideia de que vivemos num país e numa sociedade que claramente não foi feita para os nossos velhinhos, para aqueles que tomaram conta de nós em determinado momento da sua vida, e dos quais cada vez somos menos capazes de tomar conta quando chegam a idades mais avançadas.

Nunca me esqueço do comentário que um antigo chefe meu que muito prezo fez, no dia em que a minha falecida avó foi vítima de um AVC. Liguei-lhe a avisar que naquela segunda-feira não poderia ir trabalhar porque havia assuntos a tratar, pensar num sítio onde pudessem tomar conta dela, etc., e ao explicar a situação, a resposta incluiu algo como "cada vez somos menos capazes de cuidar dos nossos...".

A frase não foi feita em tom de crítica, até porque na sua vida pessoal tinha uma situação semelhante com que lidar, mas sim em tom de constatação. É uma realidade. Antigamente os pais cuidavam dos filhos e dos netos, para mais tarde os filhos e os netos tomarem conta deles. Hoje a vida não permite que tal aconteça com a mesma naturalidade. A vida profissional e os hábitos pessoais prolongam uma vida "ativa" que impede que na altura em que os mais velhos precisam de nós, não possamos lá estar para deles cuidar. E então procuram-se alternativas com um custo (mais que o monetário) pessoal.

A COVID-19 veio evidenciar isto mesmo. Temos dezenas senão milhares de velhinhos que por esse país fora, se encontram reclusos de instituições. O medo tomou posse e não existe nenhum lar de idosos que contemple, num futuro próximo, permitir visitas ou saídas dos seus "utentes". Isto na prática significa que pessoas com 80, 90 anos, tenham que lidar com o facto de estar o próximo ano, quem sabe até mais, com a sua vida em suspenso, até poderem contactar normalmene com as suas famílias. Decerto que esta perspetiva vai matar tanto ou mais que aqueles que tenham a infelicidade de ser infetados pela COVID-19. Até porque nestas instituições, se existe a infelicidade de surgir alguém infetado, a tragédia é simplesmente monumental (à data de hoje cerca de metade das fatalidades da COVID-19 em Portugal resultaram de surtos em lares).

Gostava de acreditar que muito em breve possa surgir uma solução, mais do que para erradicar o vírus (o que tenho quase a certeza dificilmente virá a acontecer) para nos ensinar a viver com ele, e que com esse ensinamento, possamos ter os nossos velhinhos de volta para poderem gozar o que lhes resta da vida de uma forma condigna e minimamente feliz. Até lá, é esperar que não seja preciso lidar com a tristeza de eles partirem no meio desta vida suspensa...

1 comentário:

mãe disse...

Eu não conseguia expor de uma forma tão clara o que sinto, principalmente o que me vais na alma.
Quando cheguei á aldeia e casa do avô, que está precisamente na situação que descreves, só consegui pensar e comentar com o pai, que o meu grande desejo era que o teu avô e meu pai consiga resistir a tudo isto para ainda ter a possibilidade de vir a sua casa e sua aldeia. Quando penso que em 88 anos de idade é o primeiro ano da vida dele que não está no mês de Agosto, no seu cantinho que para ele é encantado, sinto uma tristeza tão grande que não consigo conter as lágrimas. Que Deus me ajude para eu o puder ajudar a ele. Só peço isso.
Beijinhos